sexta-feira, 18 de abril de 2008

On the road



[Casa de campo/Varanda/tarde]

Duas grandes cadeiras de balanço estão ocupadas na varanda da pequena casa de madeira pintada de branco. Uma fina garoa cai.

[Menino, 12 anos]
Vô, posso perguntar uma coisa?

[Velho, cabelos brancos]
Claro.

[Menino]
Qual é o sentido da vida?

[Velho, surpreso]
Nossa, que pergunta é essa?

[Menino]
Ué,tava curioso. O senhor sabe qual é o sentido da vida não sabe?

[Velho]
Não, quero dizer, não exatamente.

[Menino]
Mas o senhor é velho. Já devia saber qual é o sentido da vida!

[Velho]
Bem... no final das contas o sentido da vida é ser feliz.

Passam alguns minutos. O menino se ajeita na cadeira, abraça os próprios joelhos e olha a chuva. Subitamente solta as pernas e senta-se na ponta da cadeira encarando o avô.

[Menino]
Quer dizer que... se no final da vida você não for feliz, ela não teve sentido? Assim, aquelas pessoas que a gente vê na TV, chorando porque um parente morreu numa guerra ou numa enchente... Eles não estão felizes.

[Velho]
Veja bem... Imagine que a vida é uma grande viagem.

[Menino]
Ahn?

[Velho]
Então... numa grande viagem, você passa por muitos lugares, conhece muitas pessoas...

O avô olha para o neto com um olhar paternal, espera te-lo convencido.

[Menino]
Numa viagem a gente não perde ninguém. Quero dizer, na vida, pessoas que a gente gosta muito vão embora, ou morrem. Isso não acontece numa viagem.

[Velho]
Oras, isso porque você está pensando só numa viagem de férias. Por exemplo, você pode fazer uma viagem para ajudar alguém especial para você a se mudar para outra cidade. Você vai, deixa a pessoa lá, e continua sua viagem de volta pra casa.

[Menino]
Mas...

[Velho]
Pense assim então: muitas coisas podem acontecer numa viagem: um pneu pode furar e você tem que desistir de viajar naquele momento; você pode conhecer alguém e se apaixonar, e essa pessoa pode te acompanhar pro resto da sua viagem, ou ser apenas alguém que vai fazer você se lembrar com muito carinho daquela partezinha da viagem.

O menino fica quieto. Olha para um inseto no braço da cadeira.

[Velho]
É claro que a gente não espera, mas numa viagem, pode até mesmo acontecer um acidente e alguém que viajava com a gente pode ir embora pra sempre.

[Menino]
Tá... acho que eu entendi o que o senhor quis dizer mas... a vida não pode ser uma viagem, mesmo!

[Velho, leve sorriso no rosto]
Porque não?

[Menino]
Quando a gente viaja, pode ser para levar alguém para longe, para ir pra praia, pra visitar o senhor aqui no sítio, ou até mesmo quando a gente tá voltando pra casa, sempre, sempre, a gente chega no lugar que a gente pensou que ia no começo. E na vida, no final dela, a gente morre. Assim fica parecendo que a vida seria uma grande viagem para o nada!

[Velho]
E porque a morte precisa ser o final? Talvez ela possa ser só uma paradinha para mudar de ônibus. Mas ainda assim, você vai acabar entendendo que no fim das contas, mesmo que a vida fosse uma grande viagem para o nada, o que importa não é o lugar
que você chega no final, e sim tudo pelo que você passou pra chegar até lá.

O menino olha intrigado para o avô. Aperta os nós dos dedos.

[Velho]
Quando você tá bem pertinho do fim da viagem, você acaba olhando para trás e vê tudo que você fez, tudo de bom e de ruim que aconteceu e que fizeram você mudar os planos para aquela viagem, e é só ai que você tem realmente certeza de que a viagem valeu a pena.

O menino fica cinco minutos quieto. Levanta-se devagar e cheira o ar.

[Menino]
É... acho que pode ser uma viagem então. Parece que o bolo ficou pronto, vamos comer?

O avô levanta. Passa o braço por trás dos ombros do neto.

[Velho]
Vamos sim, antes que ele esfrie com o vento que bate na janela.

4 comentários:

Goiab'dullah disse...

arrá!
seje bem vindo mininu bão!

gostei do menino tentado perguntador!
=]
hehehehehe

ele merece um nome e novas histórias
abrass

Anônimo disse...

Muito bom Celseira!
Melhor de tudo é o nome do blog... hahahahah
bonito texto...
por aqui eu fico na caverna, fugindo de tudo e de todos!
Abraços...

Goiab'dullah disse...

aguardando por novidades

Juliana disse...

um texto propicio para um livrinho espírita destinado tanto ao público adulto como as crianças...
muito bom =)