terça-feira, 23 de junho de 2009

Um Homem Bom

- Você não pode fazer isso! - respondeu ele desesperado. Apoiava-se contra a parede escura como se esperasse que ela cedesse.

- Me dê ao menos um único por motivo para eu não fazê-lo. - respondeu o outro. Mesmo mantendo seu olhar firmemente fixo nos olhos do homem que se espremia no canto sujo, caminhava com calma, medindo cada centímetro do espaço onde pisava. A pistola apontava para o peito do homem.

- Pelo amor de Deus! Não! Você não é assim, não é da sua índole. - Continuou o outro, aumentando o som da voz quase ao tom de gritos; uma tentativa desesperada de que alguém o ouvisse. Seu carrasco abriu então um largo sorriso:

- O que você sabe sobre índole? - perguntou, sentando-se sobre um grande rolo de fios de alta-tensão que estava próximo - Aliás, o que você sabe sobre a minha índole?

- Paulo, por favor! Me escuta. Você é um marido fantástico, um pai de família exemplar, um integrante ativo na comunidade - respondeu pausadamente, procurando palavras - sei lá! Você é tanta coisa!. Você simplesmente só não é assim, um assassino.

- Você se esqueceu de dizer como eu era um bom sogro.

- Sim, sim. Quase como um pai para mim!

O grande galpão no qual os dois se encontravam era parcamente iluminado por uma série de lâmpadas fluorescentes suspensas do teto, falhavando ou se apagando sozinhas aqui e alí. O espaço havia sido uma grande indústria têxtil mas já há mais de duas décadas estava abandonado. Nos últimos cinco anos, contudo, a prefeitura vinha o utilizando como um anexo ao almoxarifado municipal. A escolha, na verdade, fora uma tentativa infrutífera de coibir o fluxo alto de traficantes que usavam da edificação para vender seus produtos.

Paulo levantou rindo e fitou o outro homem. O riso vagarosamente sileciou, observava-o cuidadosamente. Ver os músculos do outro se contraírem de medo, esforçando-se para se manter de pé sobre um par de pernas que tremia visivelmente, trazia-lhe um prazer indescritível. Seus olhos brilhavam na penumbra da fábrica abandonada.

- Eu não sou um assassino? - perguntou enquanto aproximava-se mais. A arma sempre firme na altura do peito. - Talvez não seja mesmo. Mas até aí, você também não era o que você é hoje, Marcão.

- Para com isso. Você é um homem ético Paulo. Um ser completamente racional.

- Isso! - interrompeu-o bruscamente. O tom de voz alterando-se para um momento de quase alegria. - Ética e racionalidade! Será que essas duas coisas podem sempre andar juntas? Não, melhor. Eu te afirmo, essas duas coisas andam perfeitamente juntas. Veja, Kant dizia que um ato só possui valor moral se feito em nome do dever, e não de motivações pessoais e que a racionalidade é que poderia esclarecer a posteriori quais eram estes deveres. E a parte que eu acho que fecha perfeitamente o nosso caso: que uma das premissas para que a ação fosse moralmente aceita seria a necessidade de que sua motivação fosse cem porcento expansível a qualquer ser humano, em qualquer sociedade. Compreende a sutileza disso?

Marcão ficou em silêncio. Seu olhos marejaram, o que rapidamente se tornou em choro tórrido. Os soluços do homem ecoavam pelo ambiente. O barulho de ratos e alguns pássaros que voavam pelo teto ficavam diminuídos frente a intensidade de suas lágrimas.

- Você não entendeu, não é? Vou ser mais claro. Qualquer um poderia dizer que meu ato aqui é irracional. Que estou sendo levado pelo que você fez a ela. Mas, e se olharmos por outra perspectiva? E se pensarmos que minha motivação aqui obedece ao dever de respeitar garantir a vida do próximo, a integridade da família. Mais ainda, e se fazendo isso, eu só esteja estendendo à toda a sociedade o direito de andarem na rua sem temer que possam sofrer o mesmo que minha querida Maria sofreu.

- Seu Paulo, você está fora de si! A polícia vai chegar aqui a qualquer momento.

- Não Marcos, felizmente eu não estou fora de mim. Sabe que, no dia em que os policiais bateram a minha porta para me comunicar o que você fez à Maria eu fiquei fora de mim. Aquele dia sim eu fiquei. - disse vagamente, como se pudesse rever o momento - Mas assim como Edmond Dantes teve tempo para planejar sua volta por cima. Eu tive que ter tempo para entender a minha. Naquele dia eu não teria tido coragem de fazer o que eu vou fazer hoje. Você está certo quando disse que eu sou um homem bom. Exatamente por isso eu precisava deste tempo para me mostrar que eu não estaria errando ao fazer isto.

- Mas você está errando! Você enlouqueceu com a morte da Maria. Você não entende que eu também sofri muito pelo que eu fiz!

- Não acho que seja a hora para discutirmos isto. Esse tempo já passou, mas os advogados dos seus pais conseguiram impedir que nós tivessemos esta conversa antes. Sabia que, o tipo de prazer que eu sinto agora é quase igual ao prazer que você deve ter sentido enquanto estuprava a Maria.

- Louco! Você é um louco!!! Me deixa sair daqui! - disse, tentando movimentar-se rente a parede em direção a uma grande porta de madeira que estava a cerca de oito metros dos dois.

Abaixando levemente a arma atirou na perna do outro, fazendo-o cair no chão. Seus gritos fizeram os pássaros voar loucamente, batendo contra o teto de alumínio e causando uma algazarra de sons no galpão. Paulo continuou falando, enquanto evitava pisar no sangue que agora escorria próximo aos dois.

- Ou eu sou um homem bom, ou um louco. Simplesmente não posso ser os dois, Marcos. Mas continuando do ponto que parei antes que você me interrompesse. Li várias pesquisas e uma das que mais me chamou atenção foi essa que afirmava que o prazer de alguém que faz justiça com as próprias mãos é biologicamente igual ao prazer sexual.

De repente uma voz rouca soou pelo galpão, acrescentando mais um som ao barulho que se ouvia do lado de dentro:

- Atenção, é a polícia! Este galpão está cercado. Todos que estiverem aí dentro saiam com as mãos sobre a cabeça! - dizia a voz amplificada por um megafone.

Marcos riu um riso desesperado do chão onde se encontrava:

- Você tá fudido agora! Seu monstro!!

- Monstro, eu? Monstro por estar matando o homem que matou minha filha? Monstro por matar o "ser humano" que deu dezoito facadas na menina após estuprá-la. Você era o namorado dela, ela confiava em você. Não sei se as pessoas que lerem o jornal amanhã vão me achar um monstro.

- EU SOU MENTALMENTE INSTÁVEL. VOCÊ VIU NO LAUDO QUE OS ADVOGADOS APRESENTARAM PARA O JUIZ! SOCORRO!! A POLÍCIA CHEGOU E VOCÊ TÁ FUDIDO!!

- Desculpe Marcos, mas um louco não tem a menor idéia de sua loucura. E antes que você se preocupe, minha intenção nunca foi fugir. Eu quero ser preso, quero conviver por mais muitos anos sentindo o gosto de pagar conscientemente por este momento. Só preciso saber de uma coisa antes de tomar a decisão de puxar este gatilho: você se arrepende?

- Muito Paulo, demais. Me arrependi desde o primeiro momento que voltei a mim. - respondeu rapidamente, atropelando palavras. Sua feição era a de quem havia encontrado esperança. Expressão igual tomou o rosto de Paulo.

- Que bom! Por isso eu te perdôo. - respondeu, vendo os olhos do homem jogado ao chão arregalarem-se. - Mas para minha vingança ser completa eu sou obrigado a te privar deste sentimento de redenção.

O som dos dois tiros ecoou pelo galpão. Segundos depois a polícia inrompeu pela pesada porta de madeira esfacelando-a. Paulo apenas jogou a arma ao chão e erguei os braços, se deixando algemar. A foto que estampou o jornal no dia seguinte era dele sendo escoltado por três policiais. Sua feição, contudo, era o que mais chamava atenção: um sorriso leve e um olhar sereno e calmo, fitando o nada.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Visionário

Texto temporariamente retirado para manutenção. Lamentamos a inconveniência.

Alguém tinha alguma dúvida?

Bom, há algum tempo foi anunciado que o Tim Burton ia dirigir a nova versão em live action de Alice no País das Maravilhas. O grande problema são dois: É O TIM BURTON! E É ALICE NO PAÍS DAS MARAVILHAS!!!
Não, antes de qualquer equivoco eu gosto bastante do Tim Burton, mas o cara é louco.
Toda essa enrolação, na verdade, foi pra apresentar a foto abaixo, do Johnny Depp caracterizado como Chapeleiro Maluco.
Dá ou não margem para ter medo (não o mesmo tipo de medo com relação aos filmes do Michael Bay) desse filme?!



Mais fotos aqui.

domingo, 21 de junho de 2009

A Rua das Oliveiras

- Não, naquela época nem chamavam ele de Zé do Caminho. Pelo que me falaram foi uns dez anos atrás.



Dizem que já ia pela terceira semana de julho quando tudo começou. A tarde estava muito mais fria do que o normal quando o Zé foi chamado até a sala do chefe. As paredes brancas e a mobília toda em alumínio tiravam mais alguns graus de temperatura do ambiente.

- Boa tarde, Sr. José!

- Boa Tarde, Seu Márcio. - respondeu o homem ressabiado, segurando o boné azul estampado com a marca de um posto de gasolina a frente do corpo.

- Então, como o senhor deve saber os tempos estão difíceis. As vendas tem caído muito. O dólar desparou absurdamente recentemente.

- É mesmo, é? - disse o homem, sem ter a menor noção do o outro falava. Na verdade o Zé prestava mesmo era atenção nas listras da gravata do outro, e de como elas lhe causavam vertigem.

- ... então, e por tudo isso, Sr. José, eu queria informar para o senhor que a empresa está o desligando da linha de produção a partir da próxima segunda-feira.

- Como é que é? Desligando assim, de me demitindo?

- Infelizmente é isso mesmo Sr. José.

- Mas, eu nunca fiz nada na vida. Só sei é trabalhar por aqui mesmo. Não tem como demitir outro não?

- Na verdade o senhor não é o único. Vários também serão demitidos.

- Tá, então. - Virou as costas e saiu sem fechar a porta.

Caminhou vagarosamente até a saída da fábrica. Olhou para trás uma última vez e se pôs a andar novamente. Antes que alcançasse a esquina um homem o parou no caminho. Usava apenas uma bermuda laranja e camiseta preta. Devia ter no máximo uns 25 anos.

- Licença senhor, por onde fica a rua das Oliveiras?

- Opa, essa é aqui pertinho. - respondeu o Zé, articulando amplamente os braços para mostrar o caminho. Despediu-se do estranho e continuou seu caminho para casa.




O homem de barba baixou o copo e olhou para o outro, incrédulo:

- Então se tá me falando que o Zé do Caminho ficou louco por que perdeu o emprego? Se for assim a gente té ferrado.

- Tá nada Tião. Esse negócio de férias coletiva é normal nesses negócio de crise igual a gente tá agora. E outra cabra, eu nem terminei de contar ainda a história do Zé.



Nas primeiras semanas o Zé aproveitou o desemprego. Acordava tarde, ia para o bar todo final de expediente encontrar os amigos que não tinham saído da firma. O problema foi quando o fundo de garantia acabou e o dinheiro começou a ficar escasso.

- Mais que droga Matilde. Tô te falando que eu saio todo dia pra procurar emprego, mas ninguém que pegar um burro véio igual eu.

- Tá, mas se você não botar dinheiro nessa casa pra alimentar teus filhos eu levo a Giusleide, a Marinela, o Cleosmar, o Wagnaldo e o Juninho pra Paraíba de volta. E você fica!

- Faz isso não minha nega!

- Faço, e faço com gosto.

Dito e feito. Um mês e meio depois dessa conversa a Matilde levou as crianças de volta pro sertão da Paraíba deixando o pobre sozinho na capital. Ele ainda correu pra rodoviária quando soube que ela tava com os meninos por lá, mas só chegou a tempo de acenar para eles de longe, enquanto o ônibus partia.

Na escada rolante, saindo das plataformas de ônibus um senhorzinho encostou a mão no ombro dele.

- Licença meu filho, sabe onde fica a rua das Oliveiras?

- Vixi meu senhor. Você tá longe demais da rua das Oliveiras, faz assim... - Enquanto explicava o caminho pro homem, algumas pessoas em volta olhavam meio assustadas pro Zé. Mas nada que fizesse ele perceber algo.




- Olha só. Eu não imaginava que o Zé tinha passado por tudo isso não. Pra mim ele sempre foi mendigo mesmo. Sabe, tem uns que a gente acha que são nascido e criado mendigo.

- Então, eu nem lembro quem me contou tudo isso. Olha lá o Zé - disse apontando para o outro lado da rua.

Na calçada contrária à do bar passava um homem velho. As roupas imundas tinham dizeres da campanha presidencial de três anos atrás. A barba era espessa, e se tinha a nítida impressão de pequenas folhas e gravetos estavam enroscadas nela. Ele balançava os braços e apontava direções calmamente. Como se ensinasse um caminho para algúem. Depois continuava a andar cambaleando, a garrafa de cachaça numa mão e o bonezinho azul na outra.

- Quer saber de uma coisa Tião, to indo embora, a Neusa deve tá esperando com as panelas no fogo lá em casa.

- Tô indo também. Tá meio tarde já.

Os dois homens pagaram a conta e saíram do bar, na esquina de uma das ruas do centro da cidade. Andaram por três ruazinhas de pouco movimento, caminho que era comum até a casa dos dois. Alguns metros antes de chegarem na esquina onde iriam se separar, contudo, foram abordados por uma mulher. Ela vestia calça jeans e uma camiseta rosa com um gato desbotado estampado na frente.

- Oi, não sei se vocês podiam me ajudar. Eu preciso chegar num lugar, mas não to achando a rua.

- E qual rua é? - perguntou Tião à mulher.

- Não lembro direito, pera aí. - disse, pegando um papel do bolso - Aqui, achei. É na rua das Oliveiras.

Os dois homens se entreolharam e começaram a gargalhar muito alto. Algumas pessoas que passavam pela viela ficaram olhando assustadas.

E a gente finge que acredita...

Não tinha como não citar isso aqui. Nas últimas semanas, durante a divulgação de seu novo blockbuster o Sr. Michael "Boom" Bay deu a seguinte declaração:

"É fácil fazer um filme de arte numa vinícola na França. Mas as pessoas não têm ideia de como é difícil fazer um Transformers. Os críticos falam mal sem sequer terem visto o filme. Depois de três anos e meio, acho que já tive o bastante do mundo de Transformers. Preciso fazer algo diferente agora, algo sem explosões"

Agora, contextualizando: Michael Bay é o culpado por Pearl Harbour, Armaggedon, A Ilha, Transformers. Resumindo e plagiando o Omelete, se isso for verdade vai ter muito dublê feliz da vida por aí!

BOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOM!

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Desafio de Palavras (I)

Contextualizando... Eu, ele e ele topamos um desafio pra animar os três blogs. Uma vez a cada... a cada... tá, ainda não tem uma frenquência definida, mas de vez em quando um dos três vai propor uma lista de palavras completamente aleatórias para os outros dois escreverem um post. Esse daqui é o primeiro dessa brincadeira. As palavras em negrito são as da lista que ele criou:

-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-

Ela subiu a escada rolante pulando degraus. Ao sair novamente no nível da rua olhou em volta. A longa avenida estendia-se para os dois lados.
As pessoas passavam por ela apressadamente, esbarrando-se. Ninguém notou o olhar de desespero que a jovem lançava ao redor, vasculhando minuciosamente o ambiente como uma raposa observa um cacho de uvas. Finalmente avistou o que procurava, um telefone público.

- Alô?

- Instituto Médico Legal, Sandra, boa tarde. - respondeu a voz anasalada do outro lado.

- Sandra, pelo amor de Deus, eu preciso da sua ajuda. - continuou a jovem aflita.

Após um longo bocejo a mulher respondeu do outro lado:

- Pois não?

- Escuta, meu marido! Ele estava falando comigo no telefone, estava dirigindo, tinha acabado de sair do estacionamento do hospital. Mas de repente a ligação cortou! Pareceu um barulho de acidente, foi horrível.

- Na tarde de hoje quatro corpos foram trazidos para cá, senhora. - respondeu a outra, sem demonstrar qualquer preocupação. - Mas... a senhora já tentou ligar de volta?

- A bateria do meu celular acabou. Mas eu tentei sim. Pelo amor de Deus, Sandra, me fala como são as pessoas que deram entrada aí hoje.

- Não, não... Não deram entrada. A gente costuma brincar que aqui eles deram saída. Sabe como é, né?

- Sei, sei! Mas como eram os homens?

- Sabe que hoje teve um caso engraçado. Um dos homens, ele era bem gordinho. Quando chegou aqui o legista iniciou o procedimento padrão para morte por engasgamento.

- Engasgamento? Não era meu marido então, e os outros?

- Calma. Na verdade ele não morreu engasgado!

- Não?

- Nããããão!!! Você não sabe. Ele morreu na mesa do restaurante enquanto comia uma esfiha. Por isso que o Rafael achou que fosse engasgamento. Mas

depois ele descobriu que a traquéia do homem estava completamente fechada. Acredita?! O homem tinha alergia a diclofenaco potássico! Mas, ainda não descobrimos como ele tomou uma quantidade tão grande do remédio.

- Sandra. Por favor, se concentra em mim. Esse definitivamente não é meu marido. Me fala do outro homem!

- Tá! Calma! Bom, teve o homem da peruca também. Quero dizer, não era totalmente homem. Ou era homem mas não queria ser. Você entendeu?

- Não, não entendi, mas meu marido não usava peruca. Próximo!

- É sério. Eu explico. Chegou aqui usando um vestidão vermelho longo. Lindo! Uma cabeleira loira muito bem cuidada. Mas quando trocamos ela, ou ele, de maca, a peruca caiu. Aí que a gente percebeu que era um homem.

- Tá bom. Tá bom. Era um travesti. Entendi. Acredite, minha querida, meu marido não era um travesti.

- Que bom né. - respondeu a mulher, dando uma longa gargalhada. - Mas olha, vamos facilitar. Qual era a idade do seu marido?

- Trinte e Sete! Algum dos outros dois tem mais ou menos essa idade?

- Sim, sim. Os dois!

- Mas que droga! Então porque você perguntou?

- Só quis ajudar. Desculpa!

O rosto da jovem ficou subitamente vermelho. Um escarlate intenso corava a mulher enquanto o sangue corria mais fortemente por suas veias.

- Sandra. Vamos fazer assim. Eu vou te dar algumas características do meu marido e você me fala se ele é um dos outros dois homens que estão aí.

- Tá bom.

- Ele é alto. Cabelo castanho escuro, mas já tinha alguns fios grisalhos.

- Nossa!

- Que foi? É ele?

- Não! Uma caixa de algodão que tinha chegado ontem aqui sumiu! Acho que fomos roubados. Tenho certeza que foi por causa do espelho que eu quebrei ontem a noite. Você sabe né? Acho que é na mitologia grega que fala dessas coisas né? De ter azar porque quebrou o espelho.

- NÃO! NÃO É A MITOLOGIA GREGA QUE FALA ISSO! PELO AMOR DE DEUS, ME OUVE. MEU MARIDO, O CARLOS, É MÉDICO. OTORRINOLARINGOLOGISTA!

- Escuta aqui minha filha! Você pode ficar toda bravinha aí. Pode até gritar, tô acostumada já! Agora, me chamar de otorrino-sei-lá-o-que! Aí já é demais!

A jovem ficou muda do outro lado. Pensou em pelo menos um milhão de coisas para responder para a outra, mas apenas suspirou.

- Eu não estou te xingando. Otorrinolaringologia é a especialidade do meu marido. Sabe, nariz, ouvido e garganta!

- AHhhhhhhhhhhhhhhhh! Claro que eu sei. Teve até uma história estranha uma vez. Meu namorado é mais novo que eu, sabe. E teve um dia que nós estavamos conversando, e ele ia me pedir pra ir num desses médicos porque ele fala que minha voz é meio irritante. Mas aí, antes dele falar, eu tive um deja vu. Ai, como eu sabia que ele ia dizer isso, eu briguei com ele antes! Ééééééééé! Ele ficou todo assustadinho porque eu previ o que ele ia dizer.

- Sandra. - é a última pergunta que eu faço - Algum dos dois corpos que estão aí é de um médico?

- Não, não é não! São dois mendigos. Alô... Alô????? Alôôôu! Mal educada! Desligou na minha cara!