segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Mil e um anoiteceres...

Sherazade costumava me contar essa estória...

Durante séculos existiu um clã de magos que habitou as mais belas cidades árabes. Nunca houve uma pessoa sequer que pudesse dizer exatamente o que estes magos podiam fazer. Alguns diziam que eles podiam alterar sua forma, se transformando em coisas e animais. Outros diziam que eles podiam convencer qualquer homem ou mulher a fazer o que eles desejassem. Algumas senhoras acreditavam cegamente que haviam sido enfeitiçadas por alguns destes magos, se dizendo perdidamente apaixonadas por um homem que não podiam amar.
Fato é que enquanto durou a lenda, tornou-se um hábito corrente da época culpar um dos magos por decisões erradas ou inesperadas que se tomasse.


Nas primeiras vezes que Sherazade me contou essa estória ela sempre me mostrou como aqueles magos utilizavam seu poder incomensurável para alcançar tudo o que queriam. Foi numa noite, então, que eu a questionei. Se eles podiam ter tudo, fazer tudo, alcançar tudo, como então esse clã não existia até hoje? Como foi que eles não se tornaram os maiores reis de todos os tempos?

Foi então que ela me contou a estória do Príncipe Khalid. O príncipe descobrira ser um dos descendentes do clã de magos certa noite, quando viu a bela noiva de seu primo Naim na festa de casamento dos dois e desejou intimamente que ela o deixasse e fosse sua. No dia seguinte ao casamento Naim foi encontrado morto com catorze punhaladas de uma faca prateada que jazia ao lado da cama. A jovem Samra foi encontrada horas depois, dormindo abraçada com Khalid.

A jovem disse não se lembrar o que acontecera naquela noite. Ainda assim foi morta quatro dias depois. Khalid ainda duvidou que pudesse ser o causador daquela tragédia familiar até o dia em que duas novas aias que ele vira passando num dos corredores do palácio o procuraram em seu quarto a noite se oferecendo para o príncipe e saltando da sacada de seu quarto quando o dia começava a amanhecer.

Foi então que o futuro monarca entendeu o grande fardo que lhe cabia. Ele podia ter tudo o que quisesse, mas nunca por mais de uma noite. Sempre, na noite seguinte, tudo o que ele conseguira através de sua magia era tirado dele a força. Ainda mais terrível foi quando ele percebeu que ele estava começando a perder o controle sobre sua magia. Sempre que ele pensava que poderia ter alguma coisa se tornava absurdamente irresistível consegui-la através de seus poderes, ainda sabendo que perderia tudo logo depois.

Cada noite que ele usava seu poder era melhor que a noite anterior. Khalid simplesmente não conseguia sequer pensar nas consequencias de seus atos quando estava sob influência de sua própria magia. Contudo, o dia seguinte era como se todo o peso do mundo caísse sobre seus ombros. Khalid pensou que poderia se livrar de sua sina se usasse seu poder místico desejando profundamente não ter mais poderes.
Após fazer o desejo, contudo, percebeu que naquela noite quando Aníssa visitou seu leito que seu plano havia dado errado. Khalid sofreu por anos com o peso de seus desejos realizados até que um dia percebeu o que então lhe pareceu óbvio. Se não podia desejar que sua magia acabasse, poderia desejar que todos os seus súditos dividissem com ele a conseqüência de suas vontades.

Naquela mesma tarde Khalid desejou dividir seu poder com todo o seu reino. Dormiu aquela noite tranquilamente e quando foram procurá-lo em seu quarto no dia seguinte encontraram-no morto, mas com um sorriso reconfortante no rosto. Dizem que desde então, toda a humanidade é obrigada a encarar as conseqüências de tudo o que desejam.




Lembro que pedi a Sherazade para me contar uma estória mais feliz na noite que se seguiu.

Um comentário:

Goiab'dullah disse...

esse eh novo? mt bom velho, mt util pra atualidade