- Ei, Má! Acorda!
- Que foi, tô aqui Jú.
- Não tá não, você estava muito, muito longe.
- Ai Jú, você sabe que eu não tô bem. Ainda to sentindo muita falta do Pedro.
- Pelo amor de Deus, mulher! Faz três meses já, desencana disso.
- Primeiro, você sabe que eu não acredito em Deus. E segundo, eu tento Jú, eu juro que eu tento. Mas até esse café me lembra ele.
- Também pudera, monga, vocês dois vinham aqui dia sim, dia não.
- Monga é a sua... - Marina parou a frase no meio e enfiou a mão na bolsa - Espera um pouco, acho que meu celular está tocando.
Depois de tirar um kit de maquiagem, quatro cores diferentes de gloss, uma agenda e uma carteira rosa, a jovem achou o celular, que agora vibrava em sua mão. Antes de atender, olhou para o visor externo:
- Ai pode ser o Pedro! - disse Marina, soando como uma criança vendo um pacote fechado de presente.
- Como assim "pode ser", o nome dele não aparece aí no visor? - respondeu a outra, sem se mexer da cadeira.
- Não, eu apaguei o telefone dele. - replicou novamente Marina, rindo, enquanto lia em voz alta o número para ver se a amiga reconhecia.
- O sua lesada! Esse número que você falou é do seu celular!
Marina não respondeu, já havia aberto o celular e acabara de encostá-lo na orelha.
- Alôu! Isso, é Marina. Quem fala? QUÊ? - de repente, ficou pálida.
Afastou o celular da orelha e leu novamente o número para si mesma. Apertou o botão de viva-voz, para que a amiga pudesse ouvir.
-Alô, Marina.
- Estou... estou aqui. Você pode me repetir quem você é por favor? - disse, olhando para Juliana e apontando para o celular como se um inseto fosse voar de dentro dele ao invés da resposta.
- Já te falei Marina. Isso pode parecer meio estranho, mas eu sou você! Na verdade eu sou você daqui vinte e três anos.
- Isso não é possivel! - disse Juliana em voz alta, soltando-se contra o encosto de costas da cadeira.
- Olha, a Jú tá aí comigo? Nossa, já sei, vocês estão no Café? Aquele das mesinhas brancas? Eu lembro desse dia... Aii, como chamava, saco. Aproveitem esse lugar, ele fecha em menos de um ano.
- Ai Má, é sua voz mesmo. E o seu jeitinho de falar no celular.
- É... mas... o que você quer comigo, digo, com você. COM NóS, sei lá! - interrompeu Marina, fazendo sinal de silência para Juliana.
- Bom, tô te ligando porque minha terapeuta disse que seria o melhor a fazer. Depois de algumas sessões ela conseguiu achar esse aninho de sofrimento no meu passado e achou melhor dar uma ajudinha nele. Então resolvi te contar que terminar com o Pedro foi a melhor coisa que você fez, mas nós - digo, eu e você, ou só eu - sofri demais porque não sabia que tudo daria tão certo um tempinho depois.
- Você quer dizer que...
- Quero dizer que você não precisa ficar sofrendo mais. Todas as decisões que você tomou foram ótimas. Nossa vida não podia estar mais perfeita. O recado é esse: não mude nenhuma das decisões que você vai tomar, você acertou toooooddas! Lindona, preciso desligar porque você não imagina como fica caro ligar pro passado.
- Não, espera. Isso só pode ser uma brincadeira de mal gosto, você não disse se. - o telefone ficou mudo e a ligação caiu.
- Meu Deus Má, você é uma mão-de-vaca até no futuro. Desligou assim, na nossa cara, só pra não pagar caro!
- Meu, não sei o que fazer!
- Como assim, não sabe?
- É, tava pensando em voltar com o Pedro. Mas to com uma tremenda dúvida. E eu no futuro disse que terminar com o Pedro foi a melhor coisa que eu fiz, e que tudo que eu decidi foi perfeitinho. Agora... o que que eu decidi? Voltar ou não com ele?
- Ai, que papo de louco. Meu, você não acreditou nessa história de ser você no telefone?
- Ahhhh, e você não acreditou?
- Claro que não, monga!
- Aham, sei. Então porque você falou que era meu jeito de falar?
- Porque sim, Má. Sei lá, pode ser o Pedro te zoando com um programa de computador.
- Ai Jú, não tá me ajudando nada assim. Vai, finge que você acreditou. O que você faria?
- Bom, vamos lá. Se ela falou que você acertou em tudo que você decidiu, e você, antes da ligação, tava querendo voltar com o Pedro, volta logo!
- Mas porque ela falou que eu sofri um ano. Faz só três meses que nós terminamos.
- Ai Má... ela falou um ano porque você é exagerada mesmo! Sempre foi! Volta logo com o Pedro.
Alguns minutos de conversa depois Marina já tinha ligado para o ex-namorado e pedido para ele encontrá-la no café em que estavam.
Quando ele chegou Juliana já tinha ido embora, como havia combinado com a amiga. Os dois conversaram quase uma hora, e quando levantaram da mesa já estavam de mãos dadas. O sorriso de Marina cobria-lhe o rosto todo. Seu eu futuro estava certa, pensou, não podia estar mais feliz.
Pagaram a conta e saíram do café. Antes de atravessarem a rua Marina virou-se para Pedro. Beijou rapidamente, com risinhos, e tornou a virar o corpo e marchar em direção à rua. Um carro em alta velocidade cruzou a rua no mesmo momento.
- Saco! Ela entendeu tudo errado! - disse a Marina do futuro e deixou de existir.
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